quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Que bebê é esse?

Mamãe admirava seu novo bebê dormindo no berço, como era calma, dormia como um anjo, nem gemia, quase não se percebia que a casa estava habitada por um novo membro.


Papai chegou, abriu o portãozinho de ferro, cheio de arabescos, pintado de branco, olhou para o jardim onde já floriam as flores da primavera que estava por chegar. Havia uma nova rosa, branca, repolhuda a se desabrochar. Olhou para a fachada da casa, demorou-se por uns segundos, passou um rápido filme em sua mente.

Ele que tinha vindo do interior de São Paulo, seus pais roceiros, analfabetos, sua infância pobre e feliz, jogando bola no campinho de terra vermelha, descalço, quase sentiu aquela brisa quente do final das tardes de calor daquele tempo. Só ele sabia o quanto havia se esforçado pra chegar até aqui, os dias trabalhados na roça, as noites dormindo sobre os livros no supletivo noturno, as tardes de domingo como coroinha das missas do padre José. Quando chegou à São Paulo então, quanto medo, insegurança, solidão, mas houve muita luta, estudo, trabalho, um concurso público bem sucedido e o futuro casamento estaria próximo. Agora, casado, olhava para a fachada desta casa sabendo que sua esposa e filha estão lá dentro lhe esperando.

Sacudiu a cabeça, acordando pra vida, e caminhou calmamente como sempre, até adentrar pela porta da sala. Que casa impecável! Sua mulher era caprichosa mesmo, como pôde manter a casa em ordem sozinha, com uma bebê de dias para cuidar? Papai morreria sem chegar a entender o impecável mundo de Laís, onde tudo tinha seu lugar definido, era muito limpo, organizado e perfumado.

Assobiou, um assobio próprio que claramente queria dizer: “Vem aqui, vem aqui!” De dentro do único quarto da casa, onde todos os três dormiam pertinho um do outro, mamãe fez: “Chiiiiiiiiiiii! Renata está dormindo!” – sussurrando.

Papi colocou a pasta de trabalho no chão, descalçou seus sapatos, entrou no quanto desafrouxando a gravata. Um beijo na testa de mami e um olhar de admiração para sua linda bebê. Ficou ali por alguns segundinhos e olhando nos lindos olhos azuis de Laís perguntou: “Ela chorou?”.

- Não! Ela nunca chora! – contou minha mãe, admirada.

- Como pode? Nunca ouvi o choro desta menina, será que há algo de errado? – e sem que mamãe pudesse impedi-lo, pegou-me no colo e deu uma sacudidela com muito carinho e desespero para ouvir meu choro. Para seu alívio, chorei, um choro baixinho, manso, de boneca.

Seria economia de choro, para o futuro, onde tantas lágrimas eu derramaria? Seria medo de acordar, pois como que num pressentimento, eu saberia o que estaria por vir?

Que bebê é esse que vive como se não vivesse, é como se plainasse pelo ambiente, não dando trabalho, não exigindo nada, só absorvendo o carinho e amor que sua família lhe dedicavam. As idas e vindas ao mundo espiritual poderiam lhe trazer algum preparo? Penso nisso a minha vida inteira!



 

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Nasceu Renata!

Inicio minha “contação” por meu nascimento, não haveria de iniciar por outro canto desta história.

Meus pais se conheceram no Carnaval, quando meu pai teve sua folga do seminário para padres. Isso mesmo, meu pai estudava para entrar para esta categoria. Deve ter sido a mão do destino, se preferir chame de mãos de DEUS, que fez isso de maneira um pouco caprichosa, mas sem dúvida, é o divino se manifestando em minha vida, mesmo antes de eu existir.

Papai e mamãe namoraram uns 5 anos enquanto minha mãe morava no Jaçanã, em São Paulo, e meu pai em São Caetano do Sul, se casaram, fizeram a vida em São Bernardo do Campo.

Longe da família, meus pais trataram de arrumar um bebê logo no 2º ano de casamento, meu pai era oficial de justiça e minha mãe não trabalhava fora de casa, o que a fazia sentir-se só o dia todo. Sei que a solidão judiou dela nestes tempos, que chorou e se desesperou antes de engravidar. Não sei porque, quando falo nisso parece que sinto profundamente a mesma sensação que ela pode ter experimentado naqueles dias, sinto o mesmo aperto no peito que já fez parte da minha vida por tantas vezes e até os dias atuais de vez em quando aparece.

Minha mãe descobriu que estava grávida de mim também no Carnaval, pode ser daí que vem minha animação e interesse incondicional por dançar. Ela passou mal no baile, toda fantasiada, olha só que interessante.

Foi uma gravidez muito difícil, ela passou mal por toda a gestação, nada parava no seu estômago, meu pai aprendeu e acostumou levar café preto na cama, e o fez todos os dias até o último de sua vida.

Mesmo sem poder comer, minha mãezinha engordou pelo menos 25 quilos, sofreu mesmo. Certo dia, um belo copo de leite quente caiu em sua barriga, eu acabei nascendo com uma mancha derramada no bumbum, é engraçado!

No dia 10 de setembro, dia de seu próprio aniversário, ela começou o trabalho de parto, uma alegria, ter um filho num dia tão especial. Mas eu parecia não querer nascer, foram mais de 24 horas de dores e nada! Decidiu-se fazer fórceps, tenho as marcas na cabeça até hoje.

“Nasceu Renata, filha de Tárcio, oficial da 4ª vara do fórum desta comarca e D. Laís. Em 11 de setembro de 1969”. Este foi o anúncio que meu pai mandou publicar no jornal da cidade. Quanto orgulho!